SINAIS DOS TEMPOS 

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CÉREBRO

Faxina mental

Apagar informações da memória não só é natural co mo essencial para nossa sobrevivência e bem-estar

 Juliana Tiraboschi
Colaborou: Mariane Gusan

 


 

Pepe Casals

Pense no dia 3 de setembro de 2004. Tente se lembrar de tudo o que aconteceu durante o dia: que horas você acordou, o que comeu, se o clima estava quente ou frio. Difícil recordar? Não se preocupe, você é completamente normal. Nós recebemos informações ininterruptamente. Nessas condições, seria impossível gravar tudo o que vemos, sentimos e ouvimos em nossa memória. Nosso cérebro trabalha processando esses dados, armazenando o que é importante e descartando o que não tem utilidade. É por isso que você dificilmente recordará o que fez em um dia qualquer do ano passado, a não ser que alguma coisa muito importante tenha ocorrido nessa data. Estranho seria agir como uma mulher americana estudada pelo pesquisador James McGaugh, do departamento de Neurobiologia do Aprendizado e Memória da Universidade da Califórnia, um dos maiores especialistas em memória do mundo. Há alguns anos McGaugh vem pesquisando o funcionamento do cérebro dessa paciente, mas nunca encontrou nada de anormal com ela. Então como explicar que essa mulher consegue se lembrar minuciosamente dos acontecimentos em sua vida e dos fatos mais importantes que aconteceram no mundo em qualquer dia aleatório dos últimos 20 anos? Parece mentira, mas suas respostas são comprovadas pelas anotações que ela manteve em diários por muitos anos e por arquivos de veículos noticiosos. "Estamos tentando descobrir como isso acontece, mas é extraordinário", impressiona-se McGaugh. E por que essa habilidade é tão fora do comum? Simples, porque o processo natural seria que o nosso cérebro jogasse fora informações pouco relevantes. Ou seja, o esquecimento é tão natural quanto respirar.

Basicamente as memórias são classificadas em longa duração, que armazena as informações mais antigas, a memória recente (também chamada por alguns de curta duração), que retém fatos apreendidos algumas horas ou dias atrás, e a memória de trabalho (ou operacional), aquela que usamos quando memorizamos um número de telefone por alguns minutos, apenas para o esquecermos pouco tempo depois de usá-lo, ou quando estamos lendo um livro e temos que nos recordar do começo da história para entender o restante da trama. Nesse tipo de memória o esquecimento não só é comum como inerente a seu funcionamento. Recentemente surgiu ainda o conceito de memória prospectiva, ou "do futuro". É quando temos que nos lembrar de um evento que ainda vai acontecer, como uma reunião marcada para o dia seguinte.

 

 


 

Apesar de serem interligados, os circuitos da memória são independentes. Isso explica o caso de pessoas que sofrem determinadas lesões cerebrais e por conseqüência não são mais capazes de formar nenhuma memória nova, apesar de poderem evocar perfeitamente lembranças antigas. "Se você mostrar uma lista de palavras a uma pessoa com uma lesão no giro angular, ela pode não lembrar de nenhuma delas logo em seguida. No entanto, se você perguntar 10 ou 20 minutos depois, ela talvez se recorde de algumas", ilustra o neurofisiologista Gilberto Xavier, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo. As memórias são formadas por sinapses, ou conexões entre os neurônios (ver abaixo). Quando as sinapses não são utilizadas, atrofiam-se, e as lembranças ligadas a elas podem enfraquecer e até desaparecer completamente. Isso acontece quando você não vê alguma pessoa há muito tempo e a imagem dela vai se "apagando" do seu cérebro até que chega a ser quase impossível recordar as feições de seu rosto.

É como um músculo que não é exercitado e fica fraco. Seja por falta de uso ou por degeneração causada por doenças como o Alzheimer, é assim que ocorre o esquecimento real. Os outros mecanismos de falhas na evocação de memórias caracterizam-se mais precisamente como omissão de lembranças. Desses, um dos mais estudados é a repressão, processo descrito originalmente por Freud. "A repressão é uma idéia freudiana de que existe uma força ativa no cérebro que tenta impedir que material desagradável venha à consciência. Não há evidência científica disso, o que existe é evidência de supressão", acredita James McGaugh. Porém, outros cientistas acreditam que repressão e supressão sejam nomes diferentes para o mesmo fenômeno.

O esquecimento no cérebro

As memórias são formadas por sinapses (conexões entre os neurônios). Esse mecanismo consiste na justaposição entre os prolongamentos neuronais chamados axônios e dendritos. A ilustração mostra o terminal de um neurônio (A) em contato com outro neurônio (B). Entre os dois há a fenda sináptica, onde o primeiro neurônio deposita os neurotransmissores que serão reconhecidos pelos receptores do segundo.

1. Córtex entorrinal (laranja): também afetado pelo Alzheimer, como ohipocampo (azul), é fundamental para a evocação de memórias já consolidadas
2. Córtex pré-frontal: tem papel fundamental na repressão
3. Amígdala: importante no funcionamento da memória de trabalho
4. Hipocampo: peça-chave em todos os processos da memória, é afetado pelo Alzheimer e é fortemente ligado ao processo de extinção, mecanismo que também é processado pela amígdala e córtex pré-frontal

Fonte: Iván Izquierdo

Esquecer é viver
Michael Anderson, da Universidade de Oregon, é um dos maiores especialistas nesse campo. Duas pesquisas suas, uma publicada em 2001 e a outra em 2004, demonstraram que o mecanismo de repressão descrito por Freud é real. Anderson fez testes com voluntários nos quais os fazia associar pares de palavras aleatórias e depois os estimulava a lembrar apenas da primeira palavra de cada par e a esquecer a segunda. O resultado foi que os indivíduos tiveram dificuldade em recordar as palavras reprimidas, mesmo quando lhes ofereciam dinheiro por isso. "Eu não diria que eu apaguei as memórias, mas os voluntários as inibiram, tornando-as mais difíceis de serem lembradas quando desejado", explicou Anderson a Galileu. Assim como tudo o que acontece no organismo, o mecanismo de repressão tem suas funções, como suprimir lembranças dolorosas e até garantir a sobrevivência da espécie humana. "Sem a repressão nenhuma mulher teria mais de um filho, porque estaria relembrando continuamente a dor do parto", esclarece o neurocientista Iván Izquierdo, do Centro da Memória do Instituto de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Deu branco!

Conheça melhor os mecanismos de esquecimento e falhas na retenção e evocação das memórias

Esquecimento real (amnésia)
Ocorre quando as sinapses neuronais atrofiam e morrem por falta de uso, por morte celular decorrente do envelhecimento (amnésia senil benigna), intoxicação por drogas, traumatismo, enfarte cerebral e doenças degenerativas como o Alzheimer. A situação na qual alguém sofre um trauma ou acidente e esquece tudo (inclusive o próprio nome), retratada em filmes com freqüência, é rara. Porém, pode ser o caso do "Homem do Piano", um jovem entre 20 e 30 anos encontrado em uma praia da Inglaterra em abril. Ele não pronuncia nenhuma palavra, mas passa horas tocando piano com grande habilidade.

Bloqueio de aquisição
Quando a memória não chega a se consolidar acontece o bloqueio de aquisição. Pode acontecer por intoxicação: uma pessoa altamente alcoolizada, por exemplo, provavelmente não vai conseguir aprender informações novas. É muito comum isso acontecer por traumatismo, típico no caso de acidente de automóvel. O indivíduo bate o carro, desmaia, acorda e não tem a menor idéia nem de que estava dirigindo. Seu cérebro destruiu aquela informação, quando estava no processo de arquivamento ocorreu o traumatismo que o impediu de gravar.

Repressão
Também pode ser voluntária ou involuntária. Acontece quando nosso cérebro "decide" ou nós mesmos resolvemos acabar com uma memória que nos perturba muito, como um trauma. Também chamada de supressão, reprime a lembrança de fatos desagradáveis, como conseqüência da negação ou da inibição de uma memória prejudicial, negativa ou má, principalmente as de dor ou de humilhações. Às vezes fazemos força para não lembrar, mas o sistema é mais eficiente quando inconsciente.

Bloqueio de evocação
É o famoso "branco", quando queremos lembrar de algo e não podemos porque estamos muito nervosos ou distraídos. "Em um momento de alto estresse e ansiedade, seu cérebro acha muito mais importante que você se defenda do que esteja causando isso em detrimento de que você passe no vestibular, por exemplo", explica Izquierdo. Outros fatores que embaralham a memória são disfunções hormonais, distúrbio de ansiedade, depressão, tumores, uso de drogas e deficiência de vitamina B12. Estudo recente da Universidade de Michigan mostrou que fumar cigarro diminui o fluxo sanguíneo em áreas envolvidas na formação de memórias.

Extinção
Acontece quando há uma desassociação de estímulos. Na ocasião dos ataques terroristas ao World Trade Center em 2001, provavelmente a maioria das pessoas associou a imagem das torres gêmeas em chamas com perigo e morte, mas com o tempo, depois que o impacto já passou e que assistimos à imagem repetidas vezes, passamos a associar esse evento com outros estímulos, "apagando" o primeiro. Outro exemplo é quando uma pessoa que conhecemos se casa e muda de nome. A princípio associaremos aquele indivíduo com seu nome de solteiro, mas aos poucos a lembrança do novo nome se tornará mais forte e acabará substituindo a outra.

Fonte: Iván Izquierdo; Ilustrações: Serralheiro

Arquivo vivo
Sejam essenciais para a sobrevivência ou banais, as informações só são armazenadas enquanto for necessário. "Suponha que na última quarta-feira você tivesse passado muito mal depois do almoço. É importante que você retenha essa informação por um certo período de tempo para que você identifique o que causou o mal-estar e tome providências. Mas passada uma semana aquela informação pode simplesmente entrar em decaimento. Seria irrelevante arquivar", exemplifica o neurofisiologista Gilberto Xavier.

 

Dê férias para seu cérebro

Assim como nós fazemos faxina e tiramos do armário as roupas que não queremos mais, não seria ótimo se pudéssemos selecionar as informações que não nos interessam e eliminá-las para sempre de nosso cérebro? "Fazemos um pouco disso durante as férias", diz Iván Izquierdo. Quando viajamos ou descansamos, conhecemos lugares diferentes e realizamos atividades distintas das habituais. Passamos a pensar cada vez menos nos fatos do dia-a-dia e vamos os substituindo por novas experiências que vão, de certa forma, deixando as anteriores de lado. Claro que, quando voltamos ao nosso cotidiano, aquelas lembranças habituais retornam, por isso não há nada melhor do que sair da rotina para refrescar as idéias.

Esquecemos também por falta de atenção, quando o registro de alguma informação ocorre de forma superficial e os dados não são armazenados de forma consistente e duradoura. "Também esquecemos quando não entendemos, pois para uma informação perdurar ela deve ter um significado claro. Poucos se lembram do formato do mapa da Rússia, além dos russos, mas o da Itália quase todos se lembram, pois quando o estudamos vimos que tem a forma de uma bota: demos um significado ao contorno, o que favoreceu a consolidação da informação", exemplifica a neuropsicóloga Mirna Portuguez, da PUC do Rio Grande do Sul. Mas o aprendizado, se depende da memória, também necessita da eliminação de informações. "Sem o esquecimento não aprendemos. A partir do momento que se estabelece um conceito, todas as particularidades de todas as espécies de objetos ou seres que eu estou conceituando são abstraídas", ensina a psicóloga Maria Alice de Mattos Pimenta Parente, do Instituto de Psicologia da UFRGS.

Pancada na cabeça

A amnésia, mais comum no cinema do que na vida real, é o retrato preferido do esquecimento nas telas, tanto em dramas quanto em comédias. Acompanhe sua evolução:

1915
"Pérola Branca" (1915) é um bom exemplo dos primeiros dramas que se utilizam da perda de memória (tão fantástica quanto o resto de sua trama). Depois de um acidente, a protagonista vira rainha de uma tribo e mais tarde mercadoria nas mãos de piratas japoneses, até que miraculosamente seu grande amor a faz recuperar a memória
1926
O cinema começa a ter som e até o momento há pelo menos dez filmes com o esquecimento como mote
1929
É a primeira vez que um filme sugere uma nova lesão para "curar" a amnésia. Para aqueles que perderam a memória, nada melhor que uma nova agressão para recuperá-la, idéia de Tarzan, em "Tarzan, O Tigre" (1929)
1940
Em um novo movimento do cinema, os desmemoriados começam a assumir a personalidade de pessoas parecidas com eles. Em "O Grande Ditador" (1945), um velho soldado de guerra é confundido com o ditador que governa o país e assume seu lugar. Essa nova possibilidade de trama vira modelo para outros filmes
1951
Amnésia e esquecimento viram brincadeira de criança, apresentado no cinema inclusive pelo recém-lançado Tom e Jerry, depois transformado em série de TV
1962
Na década de 60 surge a idéia de esquecimento pós-traumático ou psicológico. Assassinos, soldados e vítimas são acometidos de amnésia após testemunharem crimes e mortes. O francês "Sempre aos Domingos" (1962) é um dos precursores dessa linha e trata da vida de um piloto após a Guerra do Vietnã
1990
Pouca coisa muda nos filmes que baseiam seu enredo no esquecimento, até o ótimo "Feitiço do Tempo", em que há um esquecimento geral inexplicável. Todos (com exceção do protagonista) começam a viver o mesmo dia todos os dias
1997
Nos anos 1990 e 2000, o esquecimento no cinema é tecnológico e marcado por máquinas capazes de apagar a memória. Isso acontece em "Homens de Preto" (1997), "O Pagamento" (2003) e "Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças" (2004)
2003
Em um desenho animado aparece um dos melhores personagens amnésicos da história. Dory, a peixinha azul de "Procurando Nemo"(2003), é considerada pela pesquisadora Sallie Baxendalle a mais fiel representação de um paciente com distúrbio profundo de memória. Não há mudança nem perda de personalidade e a personagem tem lapsos de lembranças o tempo todo. Outra boa referência é "Amnésia" (2000), baseado na história real do paciente conhecido apenas como HM, amplamente citado na literatura médica especializada

A "pílula mágica"
E se pudéssemos tomar um remédio que nos ajudasse a esquecer? Uma notícia divulgada no final de julho na revista científica "Nature" revelou que um grupo de psiquiatras nos EUA acredita que drogas do tipo bloqueadores beta, utilizadas largamente para tratar hipertensão, agem "apagando memórias ruins", se administradas no momento certo. Entretanto, o mecanismo não é tão simples assim. "O uso dos bloqueadores beta para o controle em situações de estresse situacional como falar em público já é antigo", conta o psiquiatra Frederico Graeff, da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto. "Mas a droga não faz esquecer um trauma, o que pode fazer é barrar um fluxo emocional excessivo, a pessoa não revive os sentimentos", esclarece. "O bloqueador beta inibe a ação da adrenalina e sua 'prima' no cérebro, a noradrenalina. Se você tem uma experiência emocionalmente estimulante, você vai liberar essas substâncias no corpo e no cérebro, e elas têm o papel de determinar o quão fortemente as memórias serão lembradas. O bloqueador beta barra a ação delas e enfraquece as memórias", detalha James McGaugh.

Quem sou eu?

Um estudo publicado no "British Medical Journal" pela neuropsicóloga Sallie Baxendalle no final do ano passado analisa como o cinema retrata distúrbios amnésicos. O objetivo é mostrar aos médicos como isso pode influenciar o comportamento de seus pacientes e familiares quando se depararem com uma situação real. Sallie estudou mais de uma centena de filmes em que o esquecimento aparece sob todas as formas, desde as mais científicas (com erros e acertos diversos) até as mais místicas. "Escolhi amnésia porque é um distúrbio neurológico sério e, diferente de outras doenças semelhantes, está presente no imaginário das pessoas por ação da ficção", explica a pesquisadora. O resultado foi que a maioria das produções mostra o fenômeno com poucas bases científicas. É o caso de "Como se Fosse a Primeira Vez" (2004), com Drew Barrymore e Adam Sandler, filme que mostra as tentativas do personagem de Sandler conquistar sua amada, que se esquece de seus encontros anteriores a cada novo dia.

Remédio para quê?
Há alguns meses veículos da mídia alardearam que cientistas haviam inventado uma "pílula da memória". Batizada de CX717 e criada em 1997 por Gary Lynch, da Universidade da Califórnia, a droga, da família das ampaquinas, melhoraria as sinapses cerebrais e estimularia a produção de glutamato, substância que favorece o aprendizado e a capacidade de memória. Ainda em fase de teste, o laboratório Cortex estuda lançar a droga comercialmente, tanto para pacientes com Alzheimer quanto para indivíduos saudáveis que querem turbinar a memória. "Não há uma evidência sólida de que a droga possa ter um efeito clinicamente útil", pondera Izquierdo. Para o neurofisiologista Gilberto Xavier, apesar da droga ter se mostrado eficaz, a utilidade dela é discutível. "Os efeitos são muito inespecíficos. As pessoas querem guardar aquelas informações que as interessam, e não uma lista enorme de outras. Será que com a droga vai favorecer as memórias do conteúdo no qual você está interessado ou vai ficar lembrando de como você segurou o sabonete durante o banho?", brinca Xavier.

"Nós temos a capacidade de aprender tudo, desde que tenhamos tempo. Não há restrição para a quantidade de informação que podemos ter no cérebro. O que é limitado é o que você pode lembrar tendo ouvido apenas uma vez", acredita James McGaugh. Portanto, se você vez por outra não consegue se recordar de algo e sente-se frustrado por isso, lembre-se de que muitas vezes um "apagão" é necessário e até saudável.

O que você não consegue esquecer (por enquanto)

Muitas de nossas lembranças que hoje são tão marcantes vão desaparecer com o tempo em meio a tantas outras memórias que se formam em nosso cérebro, enquanto outras permanecerão, para o resto da vida, quase tão fortes quanto no dia em que as processamos. Para saber a quantas anda sua memória em relação aos acontecimentos de sua vida, faça esse teste. Para cada um dos substantivos da lista ao lado você deve anotar a primeira lembrança concreta que lhe ocorrer e se esforçar ao máximo para recordar a data (você pode associar essas recordações ao que você fazia na mesma época: se estudava, se trabalhava, onde morava, que ambiente freqüentava, se estava viajando). A lembrança deve ser de uma situação real, corriqueira ou especial, e não uma associação simples de palavras. Caso você se lembre de duas situações diferentes ao mesmo tempo, escolha a que lhe parecer mais clara.

Por exemplo

Descreva sucintamente a memória de um acontecimento pessoal suscitada pela palavra "Pão":
Lembrança: Minha avó fez pão quando voltei de férias.
Quando: Mais ou menos em fevereiro de 1989. (Caso você tenha muita dificuldade em especificar o mês e o ano, você pode apontar há quanto tempo
ela aconteceu, por exemplo há dez anos, há dois meses, há três dias etc.)

Papel e caneta na mão. Descreva a memória de um acontecimento suscitada por cada uma das palavras:

Floresta
Vinho

Beijo
Tempestade
Biblioteca

Tigela
Ouro
Hospital
Cadeira
Milho
Cidade

Interpretação

Separe suas respostas em dois grupo, o primeiro com eventos que aconteceram nos últimos cinco anos e o segundo com as lembranças de situações ocorridas há mais de cinco anos.

Se a maioria dos acontecimentos que você descreveu ocorreu nos últimos cinco anos, é provável que você tenha menos de 40 anos de idade. Como assim? Os pesquisadores que aplicam o teste relacionam esse padrão de memória (com uma pequena margem de erro) ao público com menos de 40 anos num fenômeno chamado "efeito de novidade". Segundo eles, aquelas lembranças que você colocou como memórias são informações retidas pelo seu cérebro e que podem simplesmente desaparecer em alguns dias ou meses.

Se a maioria dos acontecimentos que você descreveu tem mais de cinco anos, é provável que elas tenham ocorrido entre seus 10 e 20 anos de idade, segundo o que os pesquisadores chamam de "efeito de reminiscência". De acordo com estudos feitos a partir desse teste, esse período é o mais marcante da vida para a maioria das pessoas, e são desse intervalo as memórias mais claras que se apresentam geralmente a partir dos 40 anos. Essas são de fato memórias, já constituídas e estabelecidas e dificilmente serão esquecidas por qualquer motivo.

O teste foi construído pelo pesquisador Francis Galton no século 19 e aperfeiçoado na década de 70 pelo psicólogo americano Herbert Crovitz. Está sendo aplicado em caráter experimental pela internet para a montagem de um banco de dados internacional, junto com uma análise de memorização de notícias recentes.

Confira (em português): http://memory.uva.nl/testpanel/gc/pt/index_html.


 

Você meio máquina

Nos últimos anos as pesquisas tecnológicas de vanguarda vêm trabalhando sobre o conceito de convergência que integraria não só os aparelhos digitais entre si, mas também as máquinas e o homem. Pensando nisso, alguns grupos de pesquisa estão criando formas de prevenir esquecimentos com artifícios muito mais eficientes que uma fitinha no dedo:

Em imagens: a "Sense Cam" é uma câmera fotográfica que você carrega no pescoço. Faz 25 imagens por segundo durante 12 horas e registra luminosidade, temperatura, proximidade das pessoas e movimentos bruscos. Já existe um protótipo em teste. Os pesquisadores querem implementar agora a associação das imagens a emoções com base em sinais corporais como variação do batimento cardíaco, suor nas mãos, tiques nervosos e tremedeira.

Sense cam
Fotografa 25 imagens por segundo durante 12 horas seguidas

No computador: depois de gravar o que viu e sentiu no dia, você vai precisar de um programa para organizar tudo. A Microsoft já trabalha no "MyLifeBits", software que deve realizar essa tarefa identificando padrões e possibilitando busca por palavras-chave, dias, horários, pessoas e lugares. No futuro, é esse programa que você vai usar para lembrar o nome de alguém ou onde esqueceu qualquer coisa.

Numa placa: essa proposta foi feita por Ian Pearson, pesquisador da British Telecom. Analisando o avanço da memória dos videogames Playstation, o teórico prevê a possibilidade de transferir por upload todo o conteúdo cognitivo do seu cérebro para uma placa de computador, onde tudo que você viveu sobreviverá na forma de bits dentro duma máquina.

 


 

Para ler
• "A Arte de Esquecer", Iván Izquierdo. Ed. Vieira & Lent. 2004
• "A Mente e a Memória - Um pequeno livro sobre uma vasta memória", A. R. Luria. Ed. Martins Fontes. 1999
• "Cem BIlhões de Neurônios", Roberto Lent. Ed. Atheneu. 2001

 

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