Após o 11 de setembro de 2001, o mundo ficou em
alerta para os atentados terroristas. Surgiram novas ameaças,
desta vez com armas biológicas. As suspeitas não partiram de um
avião suicida, mas sim, de cartas envelopadas que poderiam estar
transportando o vírus letal denominado Anthrax. O pânico tomou
conta, principalmente dos americanos. Bastava encontrar uma
pequena quantia de pó branco – muitas vezes confundido com
talco, farinha de trigo, sal, ou qualquer pó semelhante - para
soar o alarme de um novo ataque terrorista.
Segundo o Centro de Controle de Doenças e Prevenção, o
bioterrorismo é o uso intencional de agentes biológicos -
bactérias, vírus, parasitas ou tóxicos biológicos - com a
finalidade de produzir doenças ou pânico em uma população alvo
de terroristas. E foi o que aconteceu com a chegada “ameaçadora”
do vírus Anthrax , causada pela bactéria Bacillus
anthracis que
atinge os pulmões, a pele e o aparelho gastrointestinal. A forma
de contágio por inalação é a mais perigosa, e se não for
tratada, é fatal em 90% dos casos.
Esta não foi a primeira vez que os norte-americanos passaram
por um caso de bioterrorismo. Em 1984, em uma pequena cidade no
Estado de Oregon, 750 pessoas foram contaminadas
intencionalmente após comer uma salada contendo a bactéria
salmonella, que provocou febre e diarréia. Seguidores de uma
seita religiosa, “Bagwan Rajneesh”, foram os responsáveis pelo
ataque. Segundo os religiosos, o objetivo era influenciar os
resultados de uma eleição local.
Um vírus pelo correio
No auge do terrorismo biológico, a revista Veja (31/08/01)
publicou um especial, com o título “Agora você morre”, mostrando
as cartas contendo Anthrax, enviada ao gabinete do senador Tom
Daschle com os dizeres: "Vocês não podem nos parar. Nós temos o
Anthrax. Você morre agora. Está com medo? Morte à América. Morte
a Israel. Alá é grande". Outra carta tinha bactérias enviadas ao
jornal New York
Post e ao
jornalista Tom Brokaw, ameaçava: "Agora, é o seguinte. Tome
penicilina agora. Morte à América. Morte a Israel. Alá é
grande”.
A partir daí, o pânico se espalhou por toda o mundo.
Manifestações exigindo vacinas começaram a surgir para combater
as ameaças do “pó branco” - principalmente os carteiros, os mais
expostos aos bacilos. Escritórios políticos foram fechados, pois
na Suprema Corte americana foi detectado o vírus. A imprensa,
ameaçada com a carta contaminada, exigiu do governo proteção
para a população em risco.
Segundo a mesma reportagem da Veja, em uma das missões da
Organização das Nações Unidas enviadas para checar a produção de
armas químicas e biológicas, foram encontradas uma máquina de
congelamento a seco com a inscrição "varíola", em árabe. O pavor
aumentou com a possibilidade de que os estragos pudessem piorar
com o vírus da varíola - que chega a matar um terço dos
infectados, cegar metade dos sobreviventes e deformar o rosto de
todos.
Os norte-americanos conhecendo bem o poder devastador das
armas biológicas – incluídos também na produção e armazenamento
de amostras em laboratórios - logo suspeitaram que os ataques
poderiam ter como remetendo, o Iraque.
Alarmes falsos
Surgiram falsos alarmes relacionadas a disseminação do
Anthrax dentro e fora dos territórios dos EUA. Em Londres,
suspeitas do “pó branco” foram encontradas espalhadas na
Catedral de Canterbury – mas, após análises o resultado deu
negativo. O mesmo aconteceu com os testes iniciais realizados em
substâncias semelhantes encontradas no aeroporto de Viena, que
desmentiram a presença do vírus. Na mesma época, a União
Européia acionou todos os mecanismos de prevenção e investigação
em casos de suspeitas do Anthrax.
Como estratégia para se defender do bioterrorismo, o
presidente George W. Bush fez um orçamento propondo a liberação
de 4,5 bilhões de dólares em recursos para defender a nação
contra armas biológicas. “ Todas as nações civilizadas rejeitam,
classificando como intolerável, a utilização de doenças e armas
biológicas como instrumentos de guerra e terror”, discursou o
presidente Bush (publicado no site oficial usinfo.state.gov, em
01/11/01).
Mas os norte-americanos não foram apenas alvos de armas
biológicas. Eles também já realizaram ações terroristas
biológicas e químicas em muitos países. O assunto marcou
história para os países que sofreram ataques americanos – casos
que a imprensa abafou.
Um escritor africano, Mio Couto, escreveu em 27/3/03 uma
carta ao presidente Bush descrevendo as conseqüências que países
submissos a grande superpotência já sofreram em outros ataques
terroristas das forças norte-americanas. Exemplos como o “agente
laranja” e os desfolhantes, f ortes produtos químicos lançados
em grande quantidade por aviões norte-americanos durante a
guerra do Vietnã, e o vírus da peste contra Cuba, que durante
anos devastou a produção suína naquele país.
Ele encerra a carta dizendo que acordou do pesadelo do sono
para o pesadelo da realidade e concluía que “ porque nós, caro
Presidente Bush, nós, os povos dos países pequenos, temos uma
arma de construção massiva: a capacidade de pensar.”
Em terras brasileiras
No Brasil, “o pó branco” – que recebe maior referência à
cocaína – também fez soar o alarme, quando foi encontrado uma
sustância suspeita de Anthrax no avião Airbus A340, da
Lufthansa, com destino para Frankfurt. Confirmada a ausência da
bactéria pela Fundação Instituto Osvaldo Cruz (Fiocruz), José
Serra, na época como Ministro da Saúde, informou o caso aos
jornais, que teve grande repercussão.
Com isso, a Fiocruz não parou de receber ligações de novas
suspeitas do vírus vindas de todas as partes do País. Um artigo
publicado na Folha
de S. Paulo (18/10),
do médico e professor emérito de Dermatologia da Faculdade de
Medicina da USP, Sebastião Prado Sampaio, procurava esclarecer à
população: "Em português, antraz é a denominação para um
aglomerado de furúnculos, infecção estafilocócica relativamente
freqüente. Em inglês, ‘anthrax' designa uma infecção em animais,
mas que atinge o homem, grave e eventualmente fatal, cuja
tradução para o português é carbúnculo”. A intenção dele era
tranqüilizar as vítimas do anthrax brasileiro - mais amena e
freqüente - que o carbúnculo, ou seja, o Anthrax americano.
Após tantas ameaças, o vírus Anthrax desapareceu da mídia.
Pode ter sido extinto de vez ou pode estar armazenado em algum
laboratório terrorista. Quanto à imprensa? Essa apenas espalhou
as informações alarmantes, mas não se preocupou em limpar
tamanha “poeira”. |